João Gabriel, o cabecilha do grupo, afirmou, na primeira sessão de julgamento, na segunda- feira, 10, que tinha desistido do projecto de subversão, por, alegadamente, os seus “timoneiros”, nas circunstâncias dirigentes da UNITA, de entre eles o seu presidente, Adalberto Costa Júnior, não terem cumprido com o prometido. Porém, o irmão contrariou, na terça-feira, na segunda sessão de julgamento, essa tese com o argumento de que foi ele que partilhou o caso com um agente do SIC, identificado apenas por Ossinho, de quem é amigo
O segundo dia de julgamento, na futura Cadeia de Menores, em Kambiote (Huambo), ficou marcado com a audição ao co-réu Domingo Gabriel, que chamou o seu irmão João Gabriel Delcinho, cabecilha do grupo, de «anormal», suspeitando que ele estivesse a ser pressionado por alguém.
Disse ainda, em tribunal, que o irmão o pressionou para aderir ao aludido projecto. «O mano está a encarar isso como qualquer coisa, é um projecto muito sério. Cheguei a pensar que o meu irmão tinha recebido feitiço”, terá dito João Gabriel. Esclarece que é irmão do co-arguido e fez parte do seu agregado, sendo ele o irmão mais velho.
Apesar de o irmão ser uma pessoa influente, socialmente bem posicionada, não têm boas relações e não se falam há 5 anos. “Ele não conhece onde eu vivo. Os meus filhos não lhe conhecem”. Desta feita, ficou consignada em acta que, em Agosto de 2024, a irmã deles ligou para ele no sentido de ir à casa de João Gabriel para resolver um problema de ordem familiar, relacionado com uma irmã mais nova. A partir daquela altura, as suas relações reataram e o cabecilha passou a ligar para ele com frequência a dar conta de assuntos socio-políticos do país, mormente injustiças sociais.
Acusa o irmão de ter uma grande capacidade de persuasão. “Foi neste diálogo com ele que entendi que tinha um projecto de destruição de infra-estruturas eco- nómicas do país. Ele foi citando a refinaria de petróleo, o centro Margareth Anstee (Comissão Nacional Eleitoral). O que me espanta é que ele disse que a acção tem de ser realizada com a presença do Presidente Biden”, expôs, em tribunal, ao dizer que ficou estupefacto com a de- cisão que o irmão tinha tomado em relação à destruição de infra-estruturas e centros comerciais. Ele não acreditava no que ouvia do irmão, até porque ele cresceu em um berço cristão.
“O que me assustou é que ele disse: “tão logo isso vai ao ar, eu me pronunciarei”. E eu me perguntei: ‘o que é que se está a passar ‘‘, sustentou. Em função da proposta, perguntou ao irmão quem era realmente o verdadeiro dono do projecto que lhe tinha apresentado, cujo fito se- ria a destruição de infra-estruturas, tendo ele, por sua vez, respondido ser ele próprio o único mentor e que já dispunha dos engenhos para detonar os referidos alvos. “Comecei a encarar o meu irmão como um anormal”, acusa.
Neste sentido, o respondente disse ter sido convidado pelo irmão a ir a Luanda, de modo a mostrar-lhe os alvos previamente definidos, de modo a levar o projecto mais a sério. Na tentativa de esquivar-se da pro- posta, alegou falta de condições financeiras para o efeito, porém João Gabriel disse que aquilo não era problema, porque a logística estava toda assegurada.
O objectivo da ida à capital angolana foi para Domingos Gabriel estar por dentro do projecto que lhe tinha sido detalhado. “Queria compreender a situação para ajudar o meu irmão a sair do problema. Também me certificar do que estava a passar para eu lhe poder ajudar. Não fui só eu, também foi o guarda dele, o Francisco Nguli (co-réu)”, explica. Postos em Luanda, andaram por alguns pontos da cidade.
A dado momento, o cabecilha pediu que eles descessem da viatura, assim que chegassem às redondezas da refinaria de petróleo. Indicou alguns tanques que deviam ser destruí- dos. “Mas ele só disse a mim, porque não queria que o amigo dele, o polícia, soubesse.
O polícia não estava a entender sobre o que a gente fazia naquela zona”, explicou ante à pergunta do juiz-presidente da causa, Cipriano Catito Tchivinda, relativa ao objectivo da deslocação à capital angolana. Ele disse à audiência que se apercebeu, na viagem a Luanda, que, por detrás dele, havia políticos muito importantes. Daí em diante, simulou estar à disposição do irmão para materializar o projecto de sub- versão. Ele estaria responsável pela destruição do SIC e da central hidro-eléctrica, no Belém, ambos no Huambo.
Desta feita, o cabecilha orientou-lhe que fosse buscar os explosivos para deitar abaixo os alvos. Apanhou um transporte em direcção à sua casa e, pelo caminho, bloqueou o número telefónico do irmão. Em casa, o filho mais-velho deu pelos explosivos e comunicou à mãe, sua esposa. Esta mani- festou-se insatisfeita e pediu que os retirasse de casa.
Ele pegou a mala com os explosivos e não sabia que destino dar. Passou-lhe pela cabeça uma série de ideias, de entre as quais a de deitar em uma lixeira, mas pensou nas crianças que, volta-e-meia, se fazem aos centros de deposição de lixo. Foi daí, então, que decidi partilhar a informação com algum amigo. Encurralado, informou do aludido plano a um agente do SIC de quem esperava ter uma ideia para dar destinos aos explosivos.
O agente da lei recebeu-os, prometendo que os guardaria em uma arrecadação. Foi esse agente que se encarregou de denunciá-lo, tendo ele sido detido nas Tufas e denunciado ter sido vítima de agressão. “Estive sob tortura, tortura do SIC”, disse.
Juiz pede ao co-réu que ajude tribunal a desmontar tese de palhaçada
Tomando a palavra, passada pelo presidente da causa, o primeiro assessor, Juiz Sebastião Sambuta Nanga, reprovou a tese avançada por alguns segmentos sociais de que o Tribunal da Comarca do Huambo estaria a promover «palhaçada» com o julgamento dos sete supostos terroristas. “Para isso não aparecer por palhaçada, tendes de provar à sociedade de que isto não é palhaçada.
São as vossas respostas que nos vão ajudar a provar”, vincou, numa clara alusão a uma caricatura publicada nas redes sociais. O meritíssimo juiz apresentou algumas perguntas em suposições, o que não terá agradado à instância da defesa, tendo o advogado David Mendes protestado. O causídico argumentou que os juízes, nos termos da lei, não deviam colocar perguntas em suposições como aquelas iniciadas em “se”.
O juiz retorquiu, advertindo que os advogados concorrem para a realização da justiça. Mendes, porém, viu ralhetes nestas declarações do magistrado judicial e contra-atacou: “o juiz não pode ralhar um advogado, meritíssimo juiz-presidente”, ao que o juiz da causa anuiu. E o assessor prosseguiu com os interrogatórios, fazendo, desta feita, perguntas mais objectivas, na óptica da defesa.
Desolada, mãe espera condenação de arguidos
Gertudes Nasimba, mãe de três dos sete arguidos, nomeadamente João Gabriel, Domingos Gabriel e Creciano Kapamba, está profundamente chocada com o caso e não entende as razões que terão movido os filhos a agir desse jeito. Como mãe, sustenta ela, espera que eles respondam aos crimes de que são acusados, pois eles cresceram em um ambiente religioso, no qual lhes foi inculcada a palavra de Deus. “Acho que o meu filho é maluco, só pode.
Se eu tivesse dinheiro, levaria só o meu filho para ir se tratar”, pronunciou-se, em língua nacional umbundu. Ela viajou do Bailundo ao Huambo propositalmente para assistir ao julgamento. Saliente-se que, no primeiro dia de sessão, ela chegou a perder os sentidos.